quinta-feira, 28 de agosto de 2008

CONTRIBUIÇÕES DA IMPRENSA RADIOFÔNICA PARA A MEDIOCRIDADE DO BAHIA

Em diversos momentos, afirmei sobre a existência de vários fatores externos – para além da incompetência administrativa dos dirigentes – que transformaram neste lixo estrutural que hoje é o Esporte Clube Bahia. A memória me dá conta aqui de alguns, a exemplo do culto ao personalismo que paira na FBF ao longo dos anos; da indiferença por parte da CBF e da pesada mídia do Sul Maravilha com o futebol nordestino; além da famigerada Lei Pelé, que praticamente liquidou a oportunidade de crescimento de clubes que basicamente sobreviviam da comercialização dos direitos federativos dos atletas emergidos em suas divisões de base, favorecendo a partir de então, os grandes empresários, que passaram a ficar com a maior fatia do bolo. Tudo isso leva a concluir que os infortúnios que abatem o Bahia têm lá a sua ajuda “por fora”. Mas não podemos perder de vista que em pelo menos 80% das causas estão mesmo dentro dos muros do Fazendão, mais precisamente nas mãos e cabeças dos homens que ainda insistem em ter o Bahia como um brinquedo de suas propriedades.
Mas nas linhas que se seguem, é importante abordar um outro fator externo que vem contribuindo, e muito, para o já conhecido enxovalhamento tricolor ao longo das últimas décadas: refiro-me a atuação da imprensa esportiva radiofônica da Bahia. E por que não discutir as outras mídias? A resposta é elementar: os programas esportivos de TV., devido ao curto espaço de tempo, costumam priorizar os assuntos por um viés jornalístico, embora vez por outra costuram alguns enfoques analíticos. Jornais, revistas, e algumas home pages trabalham com as duas vertentes (informação e análise), e de forma que chega até se aproximar do contexto real dos fatos, bem porque está direcionada a um público menor, concentrado nas camadas intelectuais, nas classes economicamente distantes do segmento popular, que além do acesso a conteúdos perto do imparcial, ainda podem interativizar as informações recebidas.
Já com o rádio a situação é simetricamente oposta. Veículo de alcance direto às massas (não esqueçamos de que há ainda famílias nos grandes centros, e até cidades inteiras que estão alijadas das imagens de TV, por exemplo), passou toda a sua história apostando na idiotização das massas, de forma a prevalecer a ideologia dominante. E com o esporte, e particularmente nos movimentos que terminaram por qualificar o futebol baiano – e especialmente o Esporte Clube Bahia – em linguagens amadorísticas, não seria diferente.
Mas, para que o leitor perceba melhor a parcela de contribuição daqueles que hoje se intitulam “formadores de opinião” (eu trocaria o termo para manipuladores de consciências) quanto ao rebaixamento institucional do Bahia, é necessário antes um recuo histórico, discutindo em linhas gerais, o processo do uso do rádio para a idiotização dos indivíduos, Brasil afora. Tal fato ocorreu a partir da década de 1930, quando houve incentivos para o fortalecimento deste meio de comunicação, visando o estímulo à arte popular. Com o poder do contato direto e irrestrito a ouvintes de diversas camadas sociais, o governo populista de Getúlio Vargas forjava a crença na preocupação das autoridades quanto aos problemas do país, enquanto o povo se divertia com a massificação de aparatos culturais alienantes. Vargas apenas acompanhou a tendência de outros grandes líderes da época, como Hitler, Stalin e Roosevelt, que utilizaram as ondas do rádio, no intuito de propalar suas bases ideológicas e, concomitantemente, lapidar seus índices de aceitação perante o grande contingente, através do atrofiamento da capacidade crítica dos indivíduos. O uso da “Hora do Brasil” (hoje “A Voz do Brasil”) – criado em pleno Estado Novo (1939) – é produto deste tipo de estelionato cognitivo.
Os anos se passaram e, apesar do rádio ter cedido a sua pujança à TV., o seu papel ideológico continuou e continua inalterado. Prova disso é que as estações ajudaram, para ficarmos no esporte, na difusão da propaganda do regime militar, quando Médici aproveitou a conquista do tri mundial, para utilizar os elementos do futebol no intuito de mascarar seus genocídios e perseguições, e ao mesmo tempo, mostrar para o mundo a imagem de um Brasil em pleno desenvolvimento, com o seu povo ordeiro e na mais completa felicidade. O rádio também foi peça importante na propagação dos famosos coronéis-dirigentes antecessores às pragas maracajianas a partir da década de 1960, bem como o lançamento destes na política, tendo como meios, os holofotes atraídos para os clubes que comandavam. Uns enxergam as idéias propaladas por Osório Villas Boas no seu livro “Futebol, Paixão e Catimba” como folclóricas; outros vêem como procedimento adequado à sua época; Há também quem observe como uma patacoada, um atentado a ética desportiva. Mas o certo que aqueles conteúdos encontraram no rádio o abrigo certo para a alimentação de tal polêmica, sob a anuência / conivência dos cronistas, muitos deles ainda hoje em atividade, fingindo que o assunto não é com eles.
Tais raciocínios ajudam a explicar algumas causas que impeliram, não na decadência, mas na estagnação do rádio, enquanto outras mídias estão em acelerado processo de mudanças, ainda que passíveis de criticas contundentes. Em meio a série de reportagens produzidas pelo Jornal A TARDE em 2006, sobre a interminável crise tricolor, o periódico foi de uma felicidade incrível quando afirmou que “a imprensa baiana [hoje] (...) é a mesma ou pouco reformulada, daquela que vangloriava o time campeão de 1988” (A TARDE E.C – 08.12.2006, Pág. 6), isto é, as mesmas peças humanas estão aí, pelos microfones da vida, dizendo as bobagens que já estamos acostumados a ouvir todos os dias. Mas não acredito que seja por incompetência pessoal, e sim por conveniência – embora haja certo chefe de equipe esportiva de uma emissora das bandas do Garcia que, ao abrir a boca, se constitui sem dúvidas, numa verdadeira agressão aos estudantes de comunicação da FACOM / UFBA, ou recém formados que lutam por seu lugar ao sol.
A conveniência que interpreto no comportamento de boa parte da crônica esportiva do rádio na idiotização dos torcedores, em especial do Esporte Clube Bahia, tem a ver com as articulações com os dirigentes, no religioso pagamento do “jabá”, isto é, as viagens, as hospedagens em hotéis de luxo, os almoços, tudo em troca de um ridículo silêncio em momentos graves, como o que ora vivemos. Pobres espíritos! Poderiam abdicar desse conluio mediocre para o anestesiamento das massas, em prol do crescimento do futebol da Bahia, e por conseqüência, da valorização deles mesmos profissionalmente. Ao invés de abrir autênticas mesas redondas para falar de frente com o torcedor sobre o que ocorre sem mascaras, insistem em suas quase quatro horas diariamente distribuídas em resenhas / transmissões esportivas discutindo e lamentando futilidades, do tipo “fulano está com o pezinho doendo e é grande dúvida para domingo”. Reparem que nesses programas valorizam-se certas atitudes, como perguntas a jogadores e comissão técnica de respostas previsíveis (como o setorista que indaga ao atleta se está contente com a vitória ou triste com a derrota do seu time – quanta saudade de João Saldanha, para dar a resposta condizente!), repetições de raciocínios (pífios) em diversos momentos na mesma programação, quando não estão contendo a fúria dos incautos com propostas vazias, do tipo “ vamos esperar que o Bahia alcance o seu objetivo em campo. Os jogadores precisam de tranqüilidade. Quando acabar o campeonato, aí sim, é hora de todos sentarmos à mesa para discutirmos a administração do clube”, numa manjada artimanha, cujo objetivo é tão somente a blindagem dos “eternos”, apostando no esquecimento dos problemas empurrando-os com a barriga, a cada vitória inexpressiva, sobejamente comemorada contra adversários de igual teor.
A motivação maior quanto as tradicionais compra de consciências de cronistas do rádio pelos cartolas é o reforço em suas perpetuações nas delícias do poder. É por isso que um grupo de torcedores que protestam – mesmo que pacificamente – contra o atual estado de coisas, são sempre taxados pelos “formadores de opinião” de sanguessugas, baderneiros, falsos tricolores, que querem tumultuar, liquidar com a vida da agremiação. Os bons e verdadeiros tricolores para eles são aqueles cordeirinhos, como o cidadão que anda por todos os microfones dizendo que “o Bahia vai ser campeão da Copa do Brasil, campeão baiano, brasileiro e da Libertadores”, ainda que os próprios entrevistadores que se divertem com suas declarações, tenham plena certeza da inviabilidade material e moral para esta façanha, pelo menos neste instante. Bons e verdadeiros tricolores são aqueles que crêem nas rotineiras humilhações, não como fenômeno racional (péssimo planejamento administrativo), mas como fenômeno mágico (“foi porque Deus quis assim”; “foi porque o Bahia jogou com a camisa azul, quando deveria ser com a branca”, etc.). Quem não já teve o constrangimento ao perceber seu raciocínio interrompido quando eles permitem com reservas a participação do ouvinte ao telefone – numa tentativa de camuflar uma pseudodemocracia em seus programas – no momento em que idéias vão de encontro ao forjamento da realidade, como eles sempre fazem?
Todos esses movimentos supracitados são acrescidos de uma carga considerável de sensacionalismo, tudo em nome da blindagem dos “eternos”. Lembro como exemplo o comportamento da equipe esportiva de uma emissora de rádio localizada na Federação, que após o fatídico jogo entre Bahia x Vila Nova em 2007, esqueceu momentaneamente os impactos da tragédia, para exaltar a importância do ex-dirigente – recentemente preso pela Polícia Federal durante a Operação “jaleco Branco” – para a ascensão do Bahia à Série B).
Em suma, há de se acreditar no contributo significativo da imprensa radiofônica, nesta caminhada do Bahia ao poço cada vez mais sem fundo – e com métodos produzidos historicamente. O clube vive mergulhado em dívidas e escândalos, mas está sempre agradando “formadores de opinião”, narradores, setoristas, tudo isso para que estes prepostos levem aos incautos a idéia bizarra de que os vexames, as improbidades de décadas são resultantes apenas de uma escalação errada do treinador, da falta de condicionamento técnico / físico do elenco atual. Caso contrário – o de não ser possível alimentar o bolso desses homens de comunicação – aí para os “eternos”, há o iminente perigo de os cronistas tomarem um banho de conscientização repentina, passando a defender o óbvio: de que o Bahia, ou melhor, o futebol da Bahia, precisa urgentemente de uma revolução no gramado, nas pessoas e nas idéias.
IMAGEM: flickr.com/photos/rtppt/2548067339/

sábado, 2 de agosto de 2008

VENDA DA SEDE DE PRAIA SEM A COMPANHIA DE PLANEJAMENTO A MÉDIO E LONGO PRAZO

Uma das últimas notícias que refletem o declínio institucional do Esporte Clube Bahia dá conta da intencionalidade de negociação da Sede de Praia da Boca do Rio, que ao longo dos anos, se transformou num esqueleto arquitetônico com vista privilegiada para o mar.
Os valores estimados já estão nas mesas de discussões, mas já é consensual que o imóvel não deva ser desfeito por menos da ordem de R$ 50 milhões, ainda mais com a liberação do aumento do gabarito da orla de Salvador, anuído pelo novo Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano (PDDU) no ano passado. Os amantes do ECB se vêem verdadeiramente assombrados diante do temor de uma transação mal sucedida (tanto no tocante à venda, bem como no direcionamento dos recursos auferidos), pois a diretoria da agremiação não carrega nenhum histórico de credibilidade quanto à competência em promover a autolucrativização orçamentária. É preciso pensar, pois esse montante envolve o único patrimônio material tricolor disponível (para quem não se lembra, as péssimas influências do Basa levaram ao Bahia liquidar bens materiais (Fazendão e inúmeros atletas) e imateriais (escudo, hino e bandeira) para a famigerada Liga do Futebol – processo inclusive que dorme nos arquivos dos promotores do Ministério Público do Estado).
Já disse neste espaço certa ocasião, que competência mesmo, esses jurássicos diretores possuem quanto à transformação de dinheiro em polvilho, na transmutação de R$ 1 milhão em R$ 1 real. As desastrosas vendas de vários atletas por valores irrisórios, além da inabilidade em fazer o bolo crescer a partir do fermento injetado com os R$ 12 milhões, resultantes do contrato que deu início à parceria com o Banco Opportunitty do misterioso e corrupto Daniel Dantas em 1998, ilustram bem as afirmações supracitadas.
Mas é hora de pensarmos no futuro do clube, embora os “eternos” não façam. Reparem que em nenhum momento eles vislumbram onde aplicar este dinheiro, com vistas a garantir os destinos do clube a médio e longo prazo. Em seus discursos pífios, os objetivos não aparecem bem claros. Fala-se em aplicar na formação de um razoável elenco de atletas. Mas este é indubitavelmente um investimento volátil. É perfeitamente comparável ao direcionamento desses recursos em bolsa de valores, onde o seu desfecho (quanto ao sucesso ou fracasso) é completamente imprevisível.
É aí que sentimos a ausência de gestão, a falta de planejamento e de compromisso desses homens com a preservação daquilo que resta da própria história tricolor. Não é preciso dispor de amplo conhecimento em administração, para perceber a necessidade em canalizar parte desse montante (ainda que pequena) na compra de um espaço, o qual serviria de retorno à contribuição dos associados e, concomitantemente, promover a geração de receitas, aí sim, beneficiando o departamento de futebol (se é que o Bahia hoje tem isto no sentido prático). A falta de inteligência desses senhores é tão visível que sequer cogitam, por exemplo, a montagem de algumas lojas para a comercialização de produtos licenciados pela instituição; na parceria com empreendedores na construção de shopping center; na permuta da área com o governo pelo Estádio de Pituaçu, ainda que esta seja uma articulação de natureza complexa. Mas continuam pensando de forma mesquinha no ontem (estimulando aos incautos se vangloriarem com duas estrelas já enferrujadas de bicampeão brasileiro), no hoje e, no máximo, no próximo jogo. Em outras palavras, esses indivíduos, sem perspectivas bem definidas, insistem em enxergar o Bahia enquanto clube de passado e sem futuro.
Em condições normais, a vigílha do processo de venda, bem como da aplicação do dinheiro caberia ao Conselho Deliberativo e Fiscal da agremiação. Mas estamos cientes de que essas vacas de presépio (leia-se parentes, amigos, vizinhos de rua das pragas maracajianas) mais têm contribuído para levar o Esporte Clube Bahia ao abismo. Portanto, cabe aos poucos associados ficarem de olhos bem abertos, antes que os valores relativos ao seu único patrimônio material desçam inexplicavelmente pelo ralo, ou até suma na bacia das almas. Particularmente, até defenderia uma ampla reforma naquele equipamento, pois o vejo como um grande meio de atração de sócios (embora os eternos ditadores não desejem) e de revitalização dos clubes sociais pelo qual Salvador precisa. Mas se o desejo da maioria é a venda do imóvel, devemos nos comportar como a última trincheira, o derradeiro bastião no esclarecimento de questões que naturalmente se seguem: para onde vai esse dinheiro? Qual será o retorno dado pelo Bahia diretamente aos associados? O que a diretoria fará de concreto com essa hipotética venda, de forma a garantir o futuro da instituição a médio e longo prazo? Haverá a reserva de uma parte deste orçamento na compra de um espaço físico, no intuito de gerar receitas, oxigenando o futebol? São indagações que em nenhum momento podem se calar. E a responsabilidade é nossa.